Dirección Diagonal 113 y 63, Nº 291. La Plata, Pcia. de Bs. As.

Teléfonos 0221- 4223770 / 4250133 (interno 161)

Correo maiz@perio.unlp.edu.ar

ISSN: 2314-1131


Sobre la diversidad de cuerpos

| revistamaíz.com.ar






ECOFEMINISMO, CUIDADOS Y CONSECUENCIAS (Por Ivone Gebara) / El ecofeminismo nació, en tanto teoría, en la década de 1970. Sin embargo, dice Ivone Gebara, es vivencialmente previo, pues proviene de nuestros cuerpos heridos, de nuestros gritos de horror ante la mercantilización de la tierra. Por eso es, además, mucho más que un hallazgo científico: la teoría ecofeminista de la interdependencia resulta en realidad de la observación atenta de la vida de las personas que conviven en lo inmediato de sus cuerpos y de acuerdo con las necesidades de otros cuerpos. Como movimiento, nos convoca a respetar la diversidad de estos últimos y a acercarnos a ellos en una...
ECOFEMINISMO, CUIDADOS Y CONSECUENCIAS / El ecofeminismo nació, en tanto teoría, en la década de 1970. Sin embargo, dice Ivone Gebara, es vivencialmente previo, pues proviene de nuestros cuerpos heridos, de nuestros gritos de horror ante la mercantilización de la tierra. Por eso es, además, mucho más que un hallazgo científico: la teoría ecofeminista de la interdependencia resulta en realidad de la observación atenta de la vida de las personas que conviven en lo inmediato de sus cuerpos y de acuerdo con las necesidades de otros cuerpos. Como movimiento, nos convoca a respetar la diversidad de estos últimos y a acercarnos a ellos en una inmersión real, tanto como a luchar, en pos de una relación colaborativa entre los humanos y todos los seres de la naturaleza, contra la subordinación de esta y de las mujeres a los nefastos efectos de un progreso jerárquico, excluyente y destructivo.

Por Ivone Gebara
Filósofa y teóloga feminista brasileña. Enseñó en el Instituto de Teología de Recife e hizo formación alternativa para grupos populares en el nordeste del Brasil. Ministró cursos en diferentes Universidades internacionales y nacionales. Actualmente vive en São Paulo. Sigue dando charlas y asesorías para distintos grupos. Ha publicado numerosos libros y artículos sobre filosofía y teología feminista.

Fotos: Sebastián Miquel y Javier Godet

Afirmar a diversidade de corpos é quase uma tautologia, ou seja, uma maneira de reafirmar evidências. Afirmar que os corpos precisam ser cuidados e que há consequências quanto a responsabilidade deste cuidado é outra tautologia, pois sabemos disso e não fazemos o que deveríamos fazer.

As relações entre a diversidade de corpos e sua convivência cotidiana nunca foi uma relação tranquila e sobretudo não está sendo numa sociedade plural, beligerante e complexa como a nossa. As questões que esta convivência levanta são inúmeras e as respostas não parecem satisfazer ao bem da grande maioria das pessoas. Afinal qual é o corpo que precisa ser cuidado e respeitado? Quais corpos são maltratados e abandonados e quais cuidados necessitam? Com estas perguntas tentamos sair das abstrações do ‘dever ser’ em relação aos corpos, ‘dever ser’ sempre limitado aos nossos belos pensamentos. Buscamos entrar no movimento duro do real cotidiano e nas ações concretas possíveis. É nele que as lutas feministas tentam se situar.

O feminismo dos últimos 50 anos refletiu como prioridade a violência sobre os corpos das mulheres e a falta de cuidados e de direitos destes mesmos corpos. Os corpos das mulheres são apenas parte de muitos outros corpos que são destruídos, que respiram poluição, comem agrotóxicos, são sacrificados pelo capital e julgados úteis ou inúteis para esta sociedade que os produz e os mata devorando suas forças como devora as energias do planeta.

Os corpos femininos importam! Afirmamos sem cessar essa divisa reivindicatória como se a cada instante descobríssemos mais uma forma de desprezo de nossos corpos mantida pelo mundo patriarcal capitalista em todas as suas ramificações. Medem nossos corpos, criticam e zombam de nossa cor, exploram nossa classe, usufruem e controlam nossa sexualidade e nossa força procriativa, manipulam nossos desejos e nos impõem um cativeiro muitas vezes disfarçado de cuidado.

Nossos corpos parecem possuídos e dominados por outros corpos que também falam de justiça e de direitos para os corpos. Porém seus discursos não inoperantes, pois não tocam nossa realidade. Sempre limitam os cuidados que nos têm aos papéis que nos atribuem. Nos diziam e seguem dizendo que nossos corpos devem servir a família, à pátria, aos filhos, a Deus, a Igreja! O dever de servir e o cumprimento de nossas obrigações femininas foram consideradas uma forma de obediência à natureza que assim nos constituíra. Não podíamos negá-la, menos ainda ir além dela. Obedecer a esta ordem hierárquica superior e natural era nosso dever e nosso destino!

Com outras palavras davam quase as mesmas ordens ao planeta. A Terra deve ser submetida às necessidades dos homens, deve ser cultivada, modificada, transformada para o benefício dos humanos. A semelhança entre nós mulheres e a natureza/terra estava simbolicamente estabelecida.

Lentamente nos demos conta de que um corpo que deve servir sempre para algo pré-determinado e a alguém corre o risco de não ser para si, de não servir a si mesmo, isto é, de não ter autonomia própria, de não poder também se autocriar, de não poder interagir em igualdade de condições, de não conhecer seu próprio potencial e sua originalidade própria. Um corpo submisso aos desejos e desenhos de outros não desabrocha, não consegue mostrar sua riqueza e criatividade próprias.

Mas, como puderam os humanos ter criado a partir da natureza um fosso tão grande em relação aos diferentes direitos dos corpos sexuados? Como puderam hierarquizá-los e dar-lhes funções e espaços proibindo alguns de transitar livremente pela vida? Percebemos que, salvo exceções, fomos durante muito tempo consideradas, e nós também nos consideramos, acessórios de outros corpos ou instrumentos de manutenção da casa, úteis ao cuidado de outros corpos ou criadas por Deus para sermos apenas membros obedientes de cabeças masculinas e assim termos o céu garantido para depois de nossa morte.

É verdade que nem sempre usamos essa linguagem tão crua sobre nós, mas no fundo de nós mesmas éramos colonizadas pelas figuras que representavam o poder e a verdade sobre nós, que nos mantinham como domésticas da casa, trabalho não considerado legalmente como trabalho.



Faz pouco tempo começamos a nos mover e nos compreender de outra maneira. Fomos percebendo aqui e acolá as atrofias que nos impunham e a recuperar a música que ressoava em nossos corpos. Saíamos para a rua para entoar cantos e executar danças coletivas ritmadas pela busca dos direitos de nossos corpos e outras formas mais justas de viver. Recuperamos e valorizamos nossa semelhança a um Corpo Maior, o Corpo da Terra, com as águas, as florestas, o ar, a neve e todos os animais incluindo os insetos, os vermes, os vírus que dela procedem e nela se mantem. Faz pouco tempo nos lembramos que nossas ancestrais de muitas culturas antigas se consideravam parte do Corpo da Terra e criaram uma cultura que usava os produtos da terra sem devorar a Terra. Louvavam as forças da natureza, ritualizavam as estações do ano, e as etapas de mutação e crescimento de muitos corpos e de seus corpos femininos.

Essa cosmovisão inclusiva de certa forma continuava escondida, porém habitando nossos corpos. Pouco a pouco, resgatamos essa proximidade vital, esse pertencimento a uma vida comum maior do que nossa individualidade. Ela voltou lentamente à nossa memória ancestral e começamos a nos perceber como uma dimensão de um Corpo Maior. Uma dimensão que fora tornada como a diversidade da Terra instrumento a serviço de algo menor, a que chamamos de vontade masculina, de supremacia da razão branca, de dominação colonizadora, de dominação avassaladora da tecnologia capitalista atual. Fomos e somos instrumentalizadas pelo capital que torna tudo mercadoria e nos submete como se fosse uma divindade dominadora que nos penetra por todos os poros incluindo nossas mentes. Porém, a lembrança da liberdade, de nossa memória ancestral e imaginação criativa embora fragmentada está irrompendo de novo e estamos reagindo de formas as mais diferentes.

É nos meados do século XX que começa a consciência feminista ligada à ecologia. Para nós o corpo da Terra importa, o corpo da Terra é nosso Corpo Maior. E é, nesse momento em que a destruição do planeta para além das guerras tão comuns, torna-se destruição disfarçada de desenvolvimento e que um mentiroso projeto de riqueza e progresso para todos se transforma em escravidão e destruição para a maioria é que estamos acordando coletivamente e de novo nos organizando para salvar-nos.

Os seres humanos reconhecidos como mais bem dotados, aqueles que concebem a expansão do desenvolvimento para toda a humanidade não hesitam em continuar tornando a natureza e as mulheres mercadoria, objetos a serem dominados pela inteligência humana em benefício próprio. Não só a força de trabalho dos que só contam com sua mão de obra, mas o próprio planeta é colonizado pela ciência e tecnologia capitalista da dominação da natureza. Esse desenvolvimentismo multiforme começa também a manifestar de forma mais destrutiva seus poderes mortais sobre populações inteiras de todo o mundo.

As mulheres têm sido em um sentido preciso as primeiras vítimas e as primeiras a acordar e a reagir a este novo tipo de dominação de seus corpos e do corpo da Terra. Acordaram porque sentiram e sentem em seus corpos, em sua vida de cuidados e na busca diária de subsistência a negação de suas vidas através das muitas formas de dominação. A dominação do corpo da Terra está ligada de certa forma à dominação dos corpos das mulheres. Também os homens vivem essa dominação, porém muitos a negam para afirmar sua superioridade na chamada hierarquia dos seres. E isto porque os homens sempre quiseram apresentar-se como animais racionais capazes de se afirmar em oposição às forças ‘cegas’ da natureza das quais nós mulheres participávamos intimamente. Era como se a humanidade tivesse surgido sob a face da terra naturalmente hierarquizada e o poder tivesse sido entregue à dominação masculina e branca.

Muitas mulheres estão denunciando a distância entre a compreensão real de como vivem nossos corpos e as ideias construídas sobre eles. Estamos denunciando o esquecimento da realidade cotidiana interdependente na afirmação de projetos idealizados onde o pensamento constrói mundos ilusórios perfeitos sacrificando a materialidade real e imediata dos corpos.

Por essas razões, algumas mulheres inventaram algo contemporâneo que se chama ecofeminismo. O ecofeminismo junção entre ecologia e feminismo é em primeiro lugar a percepção corporal vital de uma interdependência. Digo percepção corporal vital ordinária porque não se trata primeiro de uma teoria ou de uma constatação científica ou laboratorial, mas de uma vivência contínua de nossos próprios corpos e essa nos convida a mudanças radicais de estilos e de concepções de vida. São nossos corpos que ressentiram as consequências das usinas nucleares, da exploração do sal gema, do ferro, do petróleo, do ouro e outros minérios que nos levaram a catástrofes e a morte de biomas e de milhares de seres humanos. São nossos corpos que viveram a expulsão de nossas terras, a destruição de nossas tradições e culturas, a errância, a recusa de sermos acolhidas por outros. São nossos corpos que choraram a morte de nossos pais, maridos, filhos/as e animais. São nossos corpos que sofrem violência doméstica e são vítimas de feminicídio.

Nossos rios desapareceram, nossas belas montanhas fundiram-se em lama tóxica, nossas florestas foram arrasadas e queimadas e milhares de animais foram mortos ou arrastados pela correnteza e tiveram que passar por inúmeros suplícios. Tudo isso está na memória de nossos corpos e não apenas nas notícias de jornais e nos relatórios políticos!

O ecofeminismo nasce de forma teórica na década de 1970 em alguns países da Europa. Porém, ele é vivencialmente anterior visto que provém de nossos corpos feridos desde muito tempo, de nossos gritos de horror frente a mercantilização da terra, frente ao pensamento de escritório, ao pensamento produzido nas ‘torres gêmeas’ onde os planos para o admirável mundo novo se fazem, onde a inesgotável promessa da novidade da redenção capitalista de todos se torna a nova religião do progresso sem cuidado e sem ternura reais.

Voltamos a insistir sobre os nossos corpos não porque vivíamos antes fora deles, não porque não gostávamos deles, mas porque nos diziam de muitas maneiras que nossos corpos de mulheres, sobretudo pobres importavam pouco. Nosso valor estava no que produzíamos, no que limpávamos da sujeira alheia, no que podíamos servir aos outros sem o direito de reclamar por direitos. O importante para nós como nos ensinaram era que nossos corpos pertenciam à pátria, à família, a Deus e aos homens, considerados cabeças dirigentes do progresso da humanidade. O que nos faziam acreditar era que fazíamos parte da materialidade da natureza e nossos corpos, cheiros, ciclos menstruais, humores, fluídos comprovavam nossa animalidade natural tão distante da excelência espiritual do pensamento masculino sobre o mundo. Nos iludíamos acreditando que nossa felicidade viria depois, e que um céu de abundantes prazeres nos aguardava. O sonho sonhado foi ilusão coletiva!

E agora, estamos acordando embora, esse acordar não fosse tão intenso quanto muitas de nós gostaríamos. As instituições patriarcais na sua diversidade têm renovadas formas de fabricar armadilhas para abafar nossa consciência nascente e crescente. Suas luzes ainda atraem a milhares de mulheres e suas promessas de beleza artificial e comodidades ainda seduzem e alimentam ainda sonhos impossíveis e recorrentes.

O ecofeminismo é apenas uma palavra cunhada para designar algo muito maior que está acontecendo. Não é apenas teoria fabricada por mulheres intelectuais em universidades, embora haja uma formulação teórica para dar autoridade às nossas reivindicações e para mostrar o fundamento real que têm. As teorias que formulamos servem para partilhar da novidade que toma corpo no meio de nós e para comprovar ‘cientificamente’ a destruição do planeta em curso.

A teoria ecofeminista da interdependência é na realidade tirada da observação atenta da vida das pessoas que convivem no imediato de seus corpos e segundo as necessidades de outros corpos. Ao afirmamos a interdependência entre os corpos estamos apenas usando uma palavra que expressa o real vivido pela natureza física e o real vivido especialmente por mulheres que vivem, por exemplo numa favela ou num bairro popular marginalizado. São elas que dizem que a falta de água potável produz diarreia nas crianças e nos adultos. São elas que dizem através de suas vidas que a falta de esgotos sanitários polui os córregos e as fontes de água. São elas que dizem que a seca não permitiu que o milho e o feijão nascessem. São elas que apontam a destruição do bosque bem perto de suas casas e a construção da fábrica de cimento em seu lugar. São elas que denunciam a fumaça branca e a tosse das crianças que precisam ser levadas de imediato para os hospitais por falta de respiração adequada. São elas que comem verduras com agrotóxicos, que comem alimentos baratos enlatados, que compram osso e sebo velho para cozinhar a sopa da noite. São elas que não têm hospitais, remédios, escolas e alimentos sadios para sua prole e para elas mesmas. A interdependência produz benefícios e malefícios e por isso somos convidadas a pensar e agir de forma coerente em todos os níveis da sociedade e em benefício da vida comum. Isto é o que chamamos de ecofeminismo. Este movimento nos convida finalmente a respeitar a diversidade de corpos, a aproximarmo-nos deles numa imersão real visto que a autoridade vivencial provém deles.

As mulheres ecofeministas não querem mais a subordinação delas mesmas assim como da natureza aos nefastos efeitos de um progresso hierarquizado, excludente e destruidor. Apostam numa relação colaborativa entre os humanos e todos os seres da natureza para além desse modelo de progresso destrutivo que nos é apresentado como um ilusório ‘admirável mundo novo’.

A vida das mulheres, dos homens e da Terra contam!



 

| revistamaiz.com.ar |
Maiz es una publicación de la Facultad de Periodismo y Comunicación Social de la Universidad Nacional de La Plata. ISSN 2314-1131.


Licencia Creative Commons
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons de Reconocimiento-NoComercial-CompartirIgual 4.0 Internacional.